sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Efeito Estufa


O mundo estava um caos. Desordem reinante espelhada no tráfego intenso, engarrafado, sufocante. O termômetro, no imenso painel eletrônico localizado numa das esquinas, revelava trinta e sete graus. O calor só aumentava a sensação de agonia.

A longa avenida, que cortava casas e prédios, parecia um mar de carros. Ao longe se percebia um vapor que subia do solo e causava sensações de inquietação. Era um caldeirão fervente que em nada agradava a quem ali se encontrava. O vento, escasso, decidiu também parar e o clima foi ficando ainda mais insípido. Até as árvores, acostumadas a bailar em público, se renderam ao destempero do momento.

Alguém, então, decidiu utilizar a buzina como ferramenta de pressão sonora. E o barulho, que já era grande, ficou insuportável devido a participação de vários outros motoristas, que passaram a reger uma orquestra infernal. O que estava lento passou a ficar definitivamente emperrado. Uma multidão de veículos ligados, a poluir o ar e os ouvidos dos transeuntes, abrigando gente estressada e fatigada sob um sol escaldante.

Nos escritórios e lojas, que dividiam espaço com as residências no imenso logradouro, o caos se espalhou: uma pane na energia elétrica fez com que os funcionários saíssem de seus postos. Toda a região ficou sem energia e o engarrafamento ganhou novos adeptos, pelo menos no que tangia ao fomento da conturbação. Nesse ínterim, a temperatura subiu para quarenta graus e o calor se intensificou com rara astúcia. E havia quem dissesse que o clima na avenida era ainda maior.

A agitação ganhou intensidade quando alguém decidiu descer do carro. Entre esbravejos e gestos incontidos, logo a atitude solitária foi ganhando simpatizantes. Além do engarrafamento, do calor, das buzinas e da poluição, agora todos se deleitavam também com o burburinho, que começou a gerar discussões. Palavrões foram proferidos. A educação tomou distância e um tumulto isolado ajudou a amplificar a desordem.

Nas calçadas, um público cada vez maior acompanhava o desarrumo. Mais que isso, muitos passaram a compartilhar daquele sentimento de revolta, insatisfação plena por somente estar ali. E um ambiente negativo, progressivamente, passou a predominar, ocasionando confrontos verbais acirrados que não tardaram em materializar-se em isolados atos de pancadaria. Cada um que quisesse resolver as coisas da própria maneira, sem perceber que em nada aquele quadro se modificava.

No auge do esperdício humano, um vento frio soprou com intensidade. A rajada invadiu toda a área e produziu de imediato um inesperado processo de inanição. Quem brigando estava parou; quem discutia perdeu a fala; quem acionava a buzinava viu a força se esvair; e todos se entreolharam, naquelas frações de segundos, com uma profunda sensação de estranheza, um medo instintivo do pior.

Mas o vento logo cessou. O tempo também. Todos permaneceram imóveis, sem reação ante aquele incomum deslocamento de ar. O calor persistiu, impetuoso. No céu, um bando de pássaros cruzou o azul em direção ao norte. As pessoas, emudecidas, retornaram aos seus carros, casas e empresas, encerrando o caos de forma também imprevisível. O misterioso sopro do desconhecido agiu com destreza. E o trânsito, enfim, foi se desfazendo aos poucos...

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Implacável



Ela abriu a porta
E foi embora.
Varreu em segundos
A minha vida.
Quebrou. Estremeceu. Zuniu.

Destelhou meu teto
E se foi.
Demoliu em segundos
As minhas pilastras.
Amaldiçoou. Triturou. Sumiu.

Ainda despedaçou meu chão
E partiu.
Dilacerou em segundos
As minhas estradas.
Correu. Pisoteou. Fugiu.

Ela...
Ventania...