quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Teste de Gravidez em 2 Horas

Era uma segunda-feira daquelas, bastante agitada. No laboratório, Maria Paula ouvia da funcionária a negativa. “Graças a Deus!”, a adolescente pensou alto, sentindo-se aliviada após o teste de gravidez. O alarme foi falso. O dinheiro ali gasto, não.

“Graças a Deus!”, pensou alto Seu Bonifácio. O laboratório de sua propriedade ia de vento em popa. A demanda a cada dia aumentava, assim como os lucros e, consequentemente, a necessidade de contratar mais gente para dar conta do serviço.

“Graças a Deus!”, também pensou alto Alzira. Naquele primeiro dia no novo emprego, esforçava-se para tão logo se adequar às rotinas técnicas do laboratório. Trabalho ali não faltava.

Aquela segunda-feira não era dia de ação de graças, mas a gratidão daquelas três pessoas era contundente. E Maria Paula voltaria ali outras vezes até ouvir o ‘sim’ – e morreria alguns dias depois disso, numa clínica clandestina, após um aborto mal sucedido; Seu Bonifácio continuaria a lucrar com a promiscuidade alheia – e a ‘adorar’ essa geração ‘malhação’; e Alzira seria em breve avó – e descobriria isso ao ver a filha de 13 anos receber a notícia ali mesmo, no seu trabalho.

Tanta gratidão... E Deus não tem nada a ver com isso...

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Da Frase, a Reflexão - Parte 2

“Muitas pessoas desculpam suas próprias faltas, mas julgam os outros severamente. Devemos inverter essa atitude, desculpando as falhas alheias e examinando severamente as nossas próprias”. (Paramahansa Yogananda)

Na fila do banco, o homem de 84 anos de idade se esquivava em aceitar o atendimento preferencial, já que a fila era única. Sem jeito, acabou cedendo e seguiu ao topo da fila. E deixou um relato interessante: "Quando eu tinha uns 12 anos, durante a segunda guerra mundial, furei a fila para pegar querosene. Um homem mais velho me chamou de moleque. Isso ecoa na minha cabeça até hoje", justificou-se.

72 anos depois, o homem mostrava nunca ter esquecido a lição. Procurava apontar o dedo para si antes de fazê-lo para outrem. E ainda que o fato narrado por ele não seja lá tão contundente, exemplifica bem a frase do mestre indiano Yogananda que abre esse post.

É preciso cobrar mais de si e exigir menos do outro. Compreender mais. Ceder mais. Entender que a verdadeira força está nos pequenos (e grandes) atos de amor cotidianos. Absorver a ideia de que, ao invés de julgar, podemos ser útil ao compreender e perdoar as falhas alheias, praticando um dos maiores gestos de caridade com o semelhante.

Não há dúvidas: o ser humano faria do mundo muito melhor se praticasse essa máxima. Fica aqui o convite...

sábado, 4 de setembro de 2010

Nada de Nadar em Nada

Não sair. Tirar férias. Eis que a mente um dia tornou-se algo fértil. Sobre mim pesam as palavras. Sobre a mesa pesam as toalhas. Sobremesas deixam-me com vontade de comer novamente.

Os gases comem o ar e penetram em minhas veias. O barulho corrompe o que vejo, sem deixar nenhum rastro que seja. Perturbo-me com o nada. Calo. Desligo. ‘Off’ é o que apenas quero. Nada de nadar em nada. Nada de zumbido agora. Zonzo, sinto minha cabeça mergulhar em mim, como um inseto rumo ao fim do dia.

Deixo rolar. Sinto rolar. Quero rolar. Rolo. Rolo como um rolo rolando na parede. Tinta para lá e para cá, expressando o branco que somos, enfeitando a casa como se fosse ela verdadeiramente nós. E os quartos? As salas? Os banheiros? A cozinha? Preciso arquitetar-me com maior tenacidade. Afinal, sou muito mais que estas belas paredes sem vida.

Perdi o fio. Sentado na poltrona deixo que todas as letras da minha mente invadam minhas mãos. Como numa teia, meus dedos articularam o máximo que pude. Houve perdas, sem dúvida. Mas quem não perde... Sempre?