sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

O Dia Que Nunca Existiu

Hoje não acordei. Não sonhei, não babei a fronha do travesseiro, nem sequer abri os olhos, enxergando-me numa sexta-feira de trabalho e sentindo o cansaço da semana em meus ombros doridos.

Hoje não levantei da cama. Não senti o calor matinal, nem ouvi o cantar dos pássaros, nem parei para olhar a vida lá fora pela janela. Não senti o sol queimando minhas escamas ressequidas do ontem, nem o vento que varria a saudade do dia anterior e balançava as folhas das árvores - fiéis, graciosas, aprisionadas.

Hoje não comi. Não escovei os dentes. Não esvaziei a bexiga. Não briguei com ninguém, nem fiz amor, nem sexo. Não falei, não andei, não desejei nada. Não sorri, não chorei, não cantei, não me decepcionei. Não falhei, nem acertei. Não fui vítima, nem algoz. Não me preocupei com a violência. Não temi o desconhecido. Não pedi dinheiro emprestado. Não rasguei cartas de amor, nem fiquei emocionado. Nada.

Hoje não fui eu. Hoje nem sequer foi hoje, 29 de fevereiro, data alheia aos últimos quatro anos. Eis um dia que nunca existiu. Quem sabe esse dia que não vivi tenha sido o mais feliz de todos os tempos? Quem sabe tenha sido uma amostra utópica do que é viver? Quem sabe nem tenha sido? Quem sabe?

Hoje não acabou. E se daqui a quatro anos eu ainda for, quem sabe esse hoje esteja lá, vívido em mim? Aí terei eu conquistado a mestria de viver com o doce gostinho da felicidade...

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O JC de hoje traz matéria interessante sobre as pessoas nascidas e registradas em 29 de fevereiro, que aniversariam de 4 em 4 anos. Quando a li já tinha escrito o texto postado acima, ainda assim, não pude deixar de perceber o quanto a nossa vida social é frágil. E essa fragilidade está bem representada na foto abaixo: um homem palestino enterrando seu filho de 6 meses, morto ontem após um ataque israelense na Faixa de Gaza. Triste realidade...



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Mas, pra não ficar só no lado trágico da vida, deixo um vídeo excelente (um pouco longo, mas que vale a pena conferir!), pra lá de positivo, que pode ser visto através do link:

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

À Espreita


"Pago meus impostos e é isso que recebo? Meu pai sai para comprar uma coca-cola, recebe um tiro no peito e vai ficar por isso mesmo? E agora? O que o Estado tem para me dizer? O que vai ser da minha família? O que é isso meu Deus?!".

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A frase acima (publicada no http://www.pebodycount.com.br/) foi dita por Edielson, que teve seu pai assassinado no último dia 24, em Olinda, quando comprava um refrigerante em uma barraca – dois marginais se aproximaram e mataram dois jovens que bebiam no local, acertando-o também. A frase, dita num momento de desespero, reflete a indignação do cidadão frente à criminalidade, especialmente nesse processo de banalização da violência que estamos vivenciando. Nesse sentido, vale postar um conto inédito que escrevi (e que será publicado num dos próximos livros que lançarei), de igual título ao desse post...

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A moto se aproxima. A mulher pressente o pior. A rua escura – caminho obrigatório no roteiro para casa – está vazia. A solitude da jovem senhora fora quebrada pelo motoqueiro contumaz.

Vinte e duas horas, marca o relógio. Agora, poucos metros dividem os passantes. O encontro parece predestinado. A mulher só pensa nos dois filhos e na ânsia de chegar em casa. Como ela queria ter o marido ao seu lado naquele instante! Mas não era hora para esses tipos de inesperados quereres. Restava-lhe contar com a sorte – já que a fé lhe andava faltando.

Os segundos se seguem e a distância entre a mulher e o motoqueiro é mínima. O barulho do motor, já muito próximo, comprova isso. Uma breve olhada e a mulher encara o motociclista, visor entreaberto e olhar fixo. Não há mais tempo para nada. A moto desacelera até parar e o brilho do revólver surge imponente, antecedendo o estrondo final, que sacode a vítima calçada abaixo. A bolsa e o celular, então largados ao relento, ganham novo dono. A fuga em duas rodas é ágil e providencial para o algoz. Não há mais tempo. Nem vida no corpo jogado ao chão.

A poucos metros de distância, um homem observa tudo de uma janela. Em silêncio, fecha a cortina, desliga a televisão e decide se recolher. Os segundos não cessam. A vida segue. E o medo continua... À espreita...

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Paradoxo

Às vezes vivo como se morto estivesse / Às vezes morro mesmo estando vivo.
Às vezes sorrio quando a vida me entristece / Às vezes choro mesmo estando sorrindo.
A vida é-me mistério / Assim como misteriosa é a minha própria dor.
O paradoxo é-me inevitável / Assim como inevitável eu mesmo sou...



A verdade não existe. Tudo no universo é uma questão de ponto de vista. A vida e todas as suas fases, a morte, o mistério de apenas ser... Nada explica o paradoxo de estar vivo... Nada atenua minha ânsia por explicações. Eu sou um mistério. Vagam em mim todas as respostas, mas não sei como encontrá-las. E cada etapa percorrida traz-me à tona em todas as minhas ambigüidades. Minhas verdades não são verazes, apenas me impulsionam a específicos pontos de visão, estreitos olhares baseados no meu ínfimo conhecimento do que é a real. E embora às vezes sorria com pormenores, vivo fechado em mim mesmo sob esse mistério chamado realidade. Mas, sei: um dia serei mais...

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Cego?

Miro o foco / Ajusto a mira / Acerto / Erro / Persisto / Fecho os olhos / Vejo...

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A cegueira tem muitos olhos que insistem em não ver. Quantos olhos temos? O quanto enxergamos? Quantos olhares desperdiçamos nesse mundo sem visão?
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Sou um fã do bom e velho rock'n roll. E não foram poucas as vezes em que escutei comentários pejorativos sobre quem gosta desse gênero. Bom: abaixo segue cartaz do movimento liderado por fãs curitibanos do (bom e velho) Iron Maiden - a banda fará show em Curitiba-PR no próximo dia 04/03 -, que estão organizando campanha em prol de crianças com câncer. Aliar diversão e boa ação dá pé. Espero que a moda pegue e contagie outros segmentos, afinal, cego é aquele que não quer ver...

O País de Mim Mesmo

Abri os olhos e percebi-me / Coletivo / Um país inteiro ao meu redor / Quantos sou em mim?




Ontem assisti "Meu Nome Não é Johnny" (foto), filme nacional com Selton Melo. Boa pedida. A história remeteu-me às tenebrosas questões do cotidiano, tais como a lei, a liberdade e a responsabilidade individual de cada cidadão. Na contra-mão de filmes como "Cidade de Deus" e "Tropa de Elite", a película mostra a vida de João Guilherme, que acabou virando um playboy do tráfico - até sair da rota após vida na prisão. Eis que, hoje, li um email que era um relato de um juiz federal que foi preso durante o Carnaval no Rio - aquele que foi tratado como bandido e questionou: "foi assim comigo, imagine com um cidadão comum?". Lei, liberdade e responsabilidade... O que temos feito para mudar o contexto à nossa volta? Quem somos nós nessa formação de um país? Somos apenas críticos ou agentes de mudança?...

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

GOLPE
(Sidney Nicéas)

Teu muro hipócrita / Derrubo num só golpe / Meu murro é duro / Minha boca, mundo / Cuidado com as minhas palavras...

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Quem é o que aparenta? Há tempos questiono a nossa dualidade. Mais: a nossa hipocrisia, face risonha que atraiçoa num piscar de olhos. Quem sois, afinal?

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No Blog de Jamildo (JC) de ontem essa foto me chamou atenção: enquanto a notícia falava no grampo da PF em Alagoas - que revelava deputados cobrando sua parte num desvio de verba da Assembléia Legislativa e da União -, a imagem revelava José Luciano, preso em Alagoas há 5 meses porque furtou uma lata de leite e queijo. Olha aí o muro hipócrita que é construído a cada dia em nosso Brasil...

De 2 em 2...

Escrevo. De 2 em 2 dias publicarei.
Se não escrever, De 2 em 2 dias lamentar-me-ei.
Atrevo-me. De 2 em 2 palavras revelarei.
Vivo. De 2 em 2 acabo sendo mais...

Bem-vindo ao Blog De 2 em 2.
A gente se fala...